24 dezembro 2009

A Gorda Sombra


A gorda na janela tampa o sol da manhã.
Nanô, o namorado, sempre lhe pedia:
fica na janela que eu quero te ver dando sombra à minha vida.
Todos os dias, a gorda postava-se à janela e sombreava a casa.
Só que para Nanô não bastava ver sua amada de costas.
Não bastava receber dela o frescor de sua sombra.
Nanô queria possuir aquela mulher como nenhum outro poderia.
Ele queria ser aquela mulher.
Tanto era o amor, que certa manhã ensolarada, a gorda sentiu um toque diferente.
Não o costumeiro toque de Nanô.
Ele pediu calma, calma que hoje vai ser melhor.
Aos poucos, Nanô foi se encostando, se amalgamando, se fazendo a gorda.
E ela gozando, suando, não pára, não pára.
Lá fora, o sol brilhava alto.
Dentro da casa, um corpo gordoamoroso passou a iluminar as paredes, os móveis, as roupas.

E a vida ali nunca mais conheceu a noite.


Ilustração: Botero

22 dezembro 2009

Alcione - a voz

Alcione é a única cantora brasileira que consegue transformar qualquer canção que tenha melodia básica e versos clichês em algo grandioso. A voz de Alcione é aquela mistura rara de técnica, força e paixão. E, mal ou bem, quando se ama esse tipo de canção que rima amor e dor, coração, emoção e paixão é muito mais eficiente.

Aqui, Alcione canta as agruras de quem não consegue se livrar de um amor manipulador. Quero ver quem tem a coragem de atirar a primeira pedra quem ainda não viveu à sombra de alguém...




Nesse, o clássico absoluto na mesma linha "dependente total do teu jeito de ser

"


e para finalizar o post humilhação amorosa, outro clássico

14 dezembro 2009

Baladas / Irrealidades

Baladas / Irrealidades é um blog de Ariadne Velasco e nos joga contra à parede:
por um lado poemas muito bem escritos, por outro, fotos da própria impondo sua aparência
de moça curvilínia, que à primeira vista passaria longe do esteriótipo de poeta.
é isso, vamos às baladas e às irrealidades, e de quebra, quebrar alguns preconceitos...

12 dezembro 2009

Uma vida em 13 degraus - Décimo Terceiro degrau

Retiram-me da cela. Talvez eu já tenha morrido. Tratam-me como morto. Ouço um ainda bem, menos um para incomodar. Ouço barulhos demasiados. O que será que esse fez? acho que esse era aquele que matava mulheres e gozava nelas. Credo. Como tem gente imunda nesse mundo. Pois é, mas era louco, imundo e louco. Nunca fui louco, estou no décimo terceiro degrau de minha vida, nunca fui louco, tudo o que eu quis era um pouco de prazer. Que culpa tinha eu se meu prazer era sangue e esperma, se era a morte do outro que provocava meu gozo. Levam-me para não sei onde. Necrotério. Mas ainda vivo, ainda estou prenhe de vontade de viver, e queria tanto mais dois degraus, só mais dois, um sepultamento e uma ressurreição. Voltar melhor, mais ameno, quem sabe? ou pior, mais inteligente, pois o que me faltou foi inteligência para apagar os rastros. O que me faltou foi perspicácia de que os homens tem desejos mas não os cumprem, tem vontades mas não saciam nenhuma delas, ficam apenas caçando quem consegue por em prática o mais fundo de si. Eu consegui. Mesmo tendo quase nada entre as pernas, eu consegui ser homem e gozar em outros buracos para além do natural. Eu consegui, quantos conseguem isso? Eles estão rindo, pegam Nele e gargalham, coitado, não é à toa que virou psicopata, com essa mixaria, até eu. Saiam daqui vampiros, gentalha menor, o que pensam que eu e Ele somos? Vísceras? eu não estou morto, tenho mais dois degraus, ouviram, tenho mais dois degraus para alcançar o céu. Eu não posso ficar preso aqui, aqui não é meu lugar. Verônica, vem me salvar, Simão, Simão, eu não te matei, eu te deixei livre, vem me salvar, vem me dar o direito a uma ressurreição. Começam a me cortar, eu não morri, grito, grito, e não me ouvem. Se eles fossem iguais a mim, entenderia, cumpriria meu papel de vítima, mas eles me cortarão, me examinarão, e não vão derramar sua porra nos meus buracos. Eu mereço isso, eu mereço que alguém me fure e goze na minha ferida, eu mereço estar do outro lado, já que não terei mais meus dois degraus, já que não serei sepultado nem ressuscitado, serei apenas um corpo jogado fora. Lixo, nada, estrume, comida para as cobras-cegas que eu matei, eu mereço porra nas minhas feridas. Rasguem-me a boca, encham meus buracos de esperma, o que estão esperando, parem de rir, parem de fazer gracinhas com Ele. Ele sou eu. Eu sou Ele, não entendem? Fui o que fui porque Ele me fez assim, essa mixaria, esse nada, esse diminuto me fez assim. Saudade da mãe e da filha. Saudade daqueles dias de contentamento aparente. Minha mãe, onde anda? e Meu pai, será que eu herdei o nada entreaspernas dele? queria ter gozado no meu pai, era isso que eu precisava ter feito. Se em vez de despedaçar insetos, se em vez de furar cabras, bezerras, putas eu tivesse furado meu pai, gozado nele, atribuído a ele o que sou, eu teria meu dois degraus, eu seria mais feliz. Eu não estaria aqui, aberto que nem um porco, sem grito, sem porra na ferida, sem gozo nenhum. Sem meus quinze degraus.

11 dezembro 2009

Uma Vida em 13 degraus- Décimo Segundo Degrau

Estou fraco. Hoje é provável que eu não atravesse a noite. Ninguém me olha mais. Peço algum carinho, alguma violência, nada fazem. Afastam-se, dizem que sou um fantasma, aparentado com o diabo. Hoje vou morrer. Estou no penúltimo degrau. Sei disso. Lamento um pouco, pois eu queria ter uma vida com quinze degraus. Ter ainda a chance de sepultamento e de recomeço, mas não vai ser possível. Se pelo menos eu tivesse mais um buracosangue para enfiá-Lo. Imagino, não basta, mas é o que resta.

09 dezembro 2009

Uma vida em 13 degraus - Décimo primeiro degrau

Condenaram-me a não sei quantos anos de prisão. Não interessa. Estou aqui, no meio de quarenta e oito iguais. Cada um deles extorquiu da vida o que pode, e por isso tá pagando o preço. Eu, que debilitei qualquer vida que tenha se aproximado de mim, estou aqui, pagando de bom grado o preço. Sinto falta de sangue, isso sinto. Sinto falta da pequena ferida no peito de Verônica, mas nada que Ele não suporte. Quando a falta aparece, aperto-o entre os dedos e Ele goza, fingindo-se dentro de uma morte qualquer. É o que basta para a alegria.

08 dezembro 2009

Uma vida em 13 degraus - Décimo Degrau

Pegaram-me. Eu deixei? Não sei mais. Só sei que me pegaram. Deixaram-me a primeira noite troncho, torto, ainda vivo e pedindo mais. Pela primeira vez eu tive resposta. Ele cada vez mais duro, parecia até maior, quanto mais me estocavam, mais eu gozava. Toda a pena que tive por mim, sumiu. Eu era homem agora. Imolado. Cordeiro, finalmente.

07 dezembro 2009

Uma vida em 13 degraus - Nono Degrau

Quando olhei as duas, atravessadas pelo espeto do churrasco, com minha porra sobre os beiços. Chorei. Mais uma vez me compadeci de mim mesmo. Foi minha terceira e última queda.

06 dezembro 2009

Uma vida em 13 degraus - Oitavo Degrau

Não sei bem como aconteceu. Moça de família. Eram apenas ela, empregada doméstica e a mãe, empregada doméstica aposentada. Passei a frequentá-las, moravam a quinze pontos de ônibus da minha casa. Não sei bem como aconteceu. Primeiro a filha e seu cabaço. Depois a mãe e seu cu em chamas. Eu e Ele nos saciamos com as duas. Uma a cada tempo. Com as duas juntas, somente quando o espeto do churrasco atravessou-lhes o estômago. Choraram. Eu e Ele gozamos sobre aquelas caras molhadas. Lágrima e porra. Gosto bom.

05 dezembro 2009

Uma vida em13 degraus - Sétimo Degrau

Depois de Verônica, fiquei três estações sem ninguém por perto. Autômato. Meu sétimo degrau foi de solidão austera, celibatária. Quer dizer, vez ou outra encontrava um igualsimão no escuro de um parque, ou uma cópiaverônica nas esquinas de sempre. Mas o celibato era por dentro. Eu não sentia mais nada. Olhava para Ele e nem raiva eu sentia. Foi minha segunda queda. Tive as mãos, os joelhos, os cotovelos e o queixo ralados. Para sempre.

04 dezembro 2009

Uma vida em 13 degraus - Sexto Degrau

Verônica. Puta de esquina. Riu quando viu, só isso? ainda tenho esse risopergunta na cabeça: só isso? sempre tive só isso. Disse que tudo bem, meteu a boca e me fez gozar. Se tivesse um sangue e uns gritos de porca iria ser melhor. Depois enxugou minha testa, gosto de você, é meio louco, mas boa gente. Fiquei com ela quinze estações. Pena que não resistiu ao corte. O sangue humano é mais carinhoso que o suíno, assim como a ferida no peito de Verônica era bem mais apertadinha que sua ferida natural. Finalmente eu tinha achado uma forma de fazer com que Ele parecesse grande.

02 dezembro 2009

Uma vida em 13 degraus - Quinto Degrau

Eu consegui me mudar para a cidade. Os bichos tinham ficado para trás. Só Ele, pequeno e cada vez mais esfolado, tinha vindo comigo. Pudesse O deixava também. Na cidade, gente demais, andanças demais. Pela primeira vez poderia, talvez, encontrar um igual, no tamanho e na fome. Encontrei um apenas Simão, irmão no tamanho. Ajudou-me um pouco, depois o afastei, queria amor, casamento, queria que eu assumisse algo que nem sei bem o que era. Menti para não matá-lo. Deveria ter feito. Se eu matasse quem primeiro me ajudou, talvez eu fosse mais homem, mais coragem.

01 dezembro 2009

Uma vida em 13 degraus - Quarto Degrau

Minha mãe disse que estava preocupada comigo, parecia que eu não andava comendo direito. Menti vitaminas, proteínas, glicídios, teu filho come muito direito, mãe, não se preocupe. Como era de seu feitio, ela não se preocupou.