19 maio 2010

Ciúme

O rosto do ciúme foi moldado

em escuridão, víbora e ofensa.

Não existe artesão capaz de criar

tal espécie de ordem: tão escudo,

tão cristal, tão imersa nos fantasmas

da beleza, tão pressa ou precipício.

Deter-se neste rosto: remoer-se

como se fosse carne nos açougues.

Atar-se ao pescoço da discórdia:

corda intumescida no desprezo

de todo o tempo ser quase inocente,

quase sempre débil nos levantes

que o amor orquestra, antes de morrer

no exílio infalível do esquecimento.

11 maio 2010




o remorso
não atinge corpos mergulhados
em coitos esquivos

festim
Hades
fundo pecado

Avessos ao medo
os hóspedes da cidade
matizam-se em azul e fantasia

Fantasmas exteriores
desconhecem o convivas
que estão para o amor
como aeronaves para o ar:

aptos à queda.



Imagem: Andre Masson

01 maio 2010

Sem anestesia

- ... ele disse que tava doendo.
- E precisava fazer isso?
- Mas... ele disse que tava doendo.
-
Tá! mas não tinha alicate, chave inglesa? Qualquer merda para arrancar esse dente?
-
Nós tentamos, mas o alicate não coube na boca, aí ele falou: “corta”...
-
E você cortou? Tá maluco?
-
Mas ele pediu! Eu ainda perguntei: tem certeza?
-
E ele respondeu o quê?
-
Bem, se ajeitou aqui sobre este tronco e falou: “Pode meter o machado no pescoço”