Levando-se em consideração tão-só a qualidade, há, mais uma vez, dois tipos de escritor: o medíocre e o genial. O escritor medíocre é fácil de reconhecer. Basta ler duas linhas, dois versos, e lá está ele: inteiro, acabado, cheio de viço. Em cada sílaba a mesmice juramentada. Já o escritor genial não é fácil de reconhecer. Dele não basta ler duas linhas, dois versos. Cada página, um ponto de interrogação. Será que é? Será que não é? Titubeamos linha após linha, verso após verso. Aborrecidos, deixamos sua obra de lado. Dias depois, quando tornamos a ele, uma vez a insegurança. Será? Trocamos impressões com os amigos - tão indecisos quanto nós - e... sim! Trata-se de vinho, não de água. Soltamos foguetes e transformamos o novo gênio em patrimônio da humanidade. Mas por que o barulho? A genialidade é um acidente biológico que não deve ser perseguido a qualquer preço. Tanto o escritor medíocre quanto o genial procuram com sua obra granjear a estima da tribo. Por isso gastam apenas parte do tempo escrevendo. A outra parte usam para desocupar as estantes, a fim de colocar no lugar das obras do passado a sua. Algumas destas novas obras injetam sangue puro na cultura. A maioria, não. Quem se importa? Amor e morte, sexo e assassinato - os mesmos cinco ou dez textos primordiais têm sido reescritos e descartados há milênios. Descartados não, devorados. O nome do monstro? Literatura.
Nelson de Oliveira, in O Século Oculto e outros sonhos provocadores. Ed Escrituras.
4 comentários:
Meus parabéns, aonde estavam escondidos versos tão bonitos?!
belíssima escolha de palavras emprestadas!
obrigado por reparti-las.
abraço.
A industria cultural impoe formas a todo tipo de arte. Nunca foi produzido tantos livros, discos e filmes em largas escalas. Hoje as livrarias estão vendendo a tão famosa literatura de baixos teores. E quem quer caloria nesses tempos?
adorei o texto
A industria cultural impoe formas a todo tipo de arte. Nunca foi produzido tantos livros, discos e filmes em largas escalas. Hoje as livrarias estão vendendo a tão famosa literatura de baixos teores. E quem quer caloria nesses tempos?
adorei o texto
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