05 setembro 2006

Ontem:

Aguia perdida,
abismo inverso,
texto jogado fora.

O ontem não se recupera,
não retorna,
não permanece além da memória.

O ontem se definha em antesdeontem.

Costuma se agarrar nas rugas,
nas rusgas, no remorso, na raiva,
o ontem tem muita vida na vida humana.

Cada boca que pronuncia:
“no meu tempo é que era bom”,
“isso, se fosse no meu tempo não aconteceria”,
faz com que o ontem germine imperativo,
acredite-se necessário,

faz dele espécie de sustentação invisível do viver.

É como se fôssemos os verbos
que conjugamos no pretérito.

Melhores porque acontecidos.


® Rubens da Cunha



9 comentários:

douglas D. disse...

há um ontem aqui
nos meus ossos
cobrando o preço
...

Claudio Eugenio Luz disse...

Sondagem enigmatica da existencia-esperiencia humana.Muito bem construido.

hábraços

Anônimo disse...

sim, somos de certa forma verbos. Beijos

ítalo puccini disse...

ele não me desgruda
(ou eu dele?)

adorei ^^
abraços

[jb] jotabê disse...

"só conheceremos o grasnado desse calendário feito só de ontens"

[jb]

Fernando Palma disse...

"melhores orque acontecidos"

Muito bom!

O ontem realmente não se recupera, sou quem mais sabe disso.
Mas podemos brincar de reiventar o ontem!

[]´s!

Anônimo disse...

lindo. há um ontem e tantos antesdeontens definhando em mim. bj.

Anônimo disse...

Uau! Nos baixos!! Um final em chave de ouro como há muito eu não via. Parabenizar já está ficando redundante. Abração, mestre!

Mme. A. disse...

Gostei muito do abismo invertido. Tudo que escrevo gira em abismos. Para cima ou para baixo, para qualquer dimensão que se abrir.

Ando pensando muito no tempo que foi e que resta, ando um pouco mórbida, sorumbática porque ele não pára e quando olho para os lados vejo que ele deixa marcas mais fundas nos que me rodeiam porque quase nunca me vejo propriamente no espelho.

Acho que muitas vezes chega a hora de olhar mesmo. E resolver usar o que resta. Tenho tentado.