Assassinaram uma praça de leitura.
Foi ali, na Reta, em São Francisco do Sul. Eu a conheci quando estive na
escola. Ela foi uma praça construída pelo esforço de alguns educadores e
alunos, que dentro das limitações, alargaram a criatividade e
construíram um delicado espaço de leitura e aprendizado. Na praça
assassinada havia também uma pequena horta comunitária. Os bancos eram
feitos de pneu chumbado. A estética da praça foi pensada para remeter ao
universo dos caminhoneiros, atividade predominante na região. Repito:
essa singela praça de leitura foi assassinada. Homens com trator
chegaram à escola, numa tarde qualquer, terraplanaram o pátio. Onde
havia uma praça de leitura, ficou um vazio analfabeto. Os assassinos da
praça, esses homens e mulheres do poder, disseram que ela estava
incomodando, que ela era uma ameaça por causa do surto de dengue, que
ela estava abandonada, por isso foi melhor matá-la. Cinicamente, eles
prometeram outra praça no lugar, mas uma praça mais adequada aos seus
modelos de educação: uma praça fechada, com cercas, alambrados, toda
cimentada, uma praça bem neoliberal e não mais essa praça feia, feita à
mão, cheia de pneus que remetem a “pobreza” da região. O fato é que os
homens e mulheres do poder assassinaram a praça pobre da escola. Não
pensaram em reformá-la, não pensaram em investir nela como espaço
possível de educação e cidadania, não pensaram em fazer dela um modelo
transformador, não pensaram em fazer daquele breve espaço no meio da
escola num amplo espaço de liberdade, de consciência humanitária. Não,
os responsáveis pela escola só pensaram em assassinar a praça de
leitura. A analogia é óbvia: a praça de leitura assassinada são todos os
deixados de lado, os excluídos, os assassinados pela indiferença, pelo
preconceito, pela mesquinharia dos homens e mulheres do poder. A eles
não é dado o direito de existência, melhor, eles só podem existir se
forem invisíveis, se não incomodarem o andamento dos trabalhos. E,
convenhamos, uma praça de leitura é um incômodo, um percalço para essa
gente que não gosta leitura e de toda a força, liberdade e vida que ela
traz. Uma praça de leitura foi assassinada. Definitivamente, é tempo de
luto e de luta.
27 maio 2015
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3 comentários:
Que bela crônica, que forte!
Rubens da Cunha :)
Obrigado Luciana
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